terça-feira, 14 de setembro de 2010
quarta-feira, 1 de setembro de 2010
Revolución
Em Kuna Yala esteve Sebastián, um jovem mexicano, mochileiro, latino-americano de alma e de estrada, cabeludo, que viajou no mesmo ônibus que o nosso da Costa Rica até a Nicarágua. Topamos com ele na aduana, quando esperávamos o motorista retornar com os nossos passaportes carimbados. Puxei conversa, ele contou que estava voltando do Panamá, onde esteve hospedado na aldeia dos índios Kuna.
Este povo é reconhecido internacionalmente, são considerados os índios mais autonômos do mundo. E esse título não veio à toa. No início do século, a partir da independência do Panamá em 1903, o território habitado pelos Kuna foi alvo de invasores que buscavam ouro, tartarugas marinhas e outras fontes de exploração. Eles também sofreram com os ataques da polícia colonial, que assassinaram muitos índios. Descontentes com esta situação, os Kuna Yala, liderados por Nele Kantule organizaram um levante em 25 de fevereiro de 1925, que ficou conhecida como a Revolução Kuna. Eles proclamaram a República de Tule, separando-se do governo central panamenho. Em seguida foi assinado um tratado de paz, em que se estabeleceu que o Governo do Panamá zelaria pelos costumes e a cultura do povo Kuna. Daí em diante os índios aceitaram negociar, concordaram com a implantação de escolas e a expulsão dos policiais do território indígena. Os prisioneiros também foram liberados. As negociações ajudaram a pôr um fim no conflito armado e foram determinantes para a preservação da cultura dos Kuna Yala. Anos depois o território indígena foi reconhecido e estabelecido como Comarca Kuna de San Blas, com seus limites definidos. Atualmente eles têm um regimento próprio, com autonomia política e administrativa. Todo ano eles se reúnem para um Congresso Geral, onde decidem as ações da comunidade.
Sebástian nos brindou com seus relatos, falou do aprendizado na aldeia, do apoio e generosidade dos índios que o abrigaram e alimentaram e o ensinaram a tecer. Quando já nos encaminhávamos para retornar ao ônibus, o motorista o convidou para falar com uns policiais e inspetores. Adentrei ao veículo, busquei meu livro de Bolaño. Tentei ler, não consegui. Fiz um carinho em minha pretinha e recostei a poltrona. Sebastián retorna em cinco minutos. Conta-nos que os inspetores e policiais suspeitaram dele somente por ser de nacionalidade mexicana. Ele fala em tom de irritação.
- Carajo! En todo lado eso. En Panamá la misma cosa. Preguntarón cuál cartel yo represento.
Que chinguada!
Penso comigo: "Até quando isso? Até quando mexicanos, bolivianos, peruanos, nigerianos, árabes, palestinos, curdos, vietnamitas, tupinambás, xucurus, sem-terra serão discriminados e amordaçados e feridos? Até quando nós, latino-americanos, africanos, asiáticos, seremos culpados pelas misérias e barbáries e crimes do mundo? Até quando a Europa vai ser o centro do planeta? Até quando os Estados Unidos da América vão sustentar a égide da liberdade e da democracia? São eles que metralham o mundo em busca de ouro, petróleo, cocaína. São eles, não todos, um grupo pequeno deles, uma confraria de ladrões e exploradores e uma renca de explorados, viciados, soldados que obedecem e se vendem a troco de dinheiro e status e sexo e drogas. A gente tem que virar esse jogo. É evidente a luta de classes. É mais que urgente, é preciso transformar o mundo e não ficar por aí divagando como pseudo-intelectual, falando de estética e se referindo a autores clássicos e contemporâneos... é preciso muito mais, sair às ruas, sentir a massa, ir com a massa, se enganar, refletir, chorar, se contaminar, ferir-se, se indignar, lutar, morrer em nome de uma causa, de um povo, de uma terra. Aqui estamos, Nicarágua, tierra libre y de justicia social. Adelante! Mi corazón llora Sandino"
Assim ganhamos a noite, eu, indiazinha e nosso amigo Sebástian. Uma chuva torrencial caía sobre Manágua. Ele não conseguiu hospedagem, o abrigamos em nosso hotel. Na manhã seguinte bem cedinho ele partiu. Rumou para uma praia com uma amiga mochileira. Nós também botamos o pé na estrada. O Sr. Marvin foi o responsável por nos guiar até León, mas antes passamos em León Viejo, a antiga cidade que foi tomada pelas larvas do vulcão Momotombo há muito tempo atrás, séculos passados. Uma imagem ficou como lembrança, de um campesino em sua terra resistindo, lutando, com o arado e a foice, os mesmos instrumentos da revolução.
Aqui compartilho com vocês:
quarta-feira, 18 de agosto de 2010
Otros Aromas
terça-feira, 17 de agosto de 2010
Perrengue y Rutas y Colores y Buenissima Onda!
quinta-feira, 12 de agosto de 2010
dias de dor e ternura
Chegamos em Manaus na segunda pela manhã. O último dia da viagem Belém-Manaus foi especial e divertido. Estávamos no andar superior do navio, filmando e fotografando. O sol preparava-se para adormecer nas águas do Rio Amazonas quando um grupo de jovens aproximou-se. Falavam espanhol, perguntei a nacionalidade, eles me respoderam: "Somos de Colombia." Apresentamo-nos e contamos a eles da nossa viagem. Falamos por muito tempo. Eles nos contaram que vinham de Belém, que estavam num congresso internacional de arte dramática, que estudavam teatro em Bogotá e que faziam parte de um movimento por lá. Logo me entusiasmei, e pedi para que me falassem um pouco de Uribe e das Farc, da política na Colômbia. Eles me propuseram tocar uma canção deles, que era uma espécie de protesto, de recusa a este governo fascista. Falamos bastante de política, eles me pediram para não filmar os depoimentos. Em Colômbia se vive uma guerra, foi o que me disse Luiz. E para repreender esta guerra, fazem arte, inventam, perturbam, bagunçam o centro de Bogotá com faixas e malabares e teatro e dança. Esta é a forma de atuar do movimento. Eles nos contaram ainda que há uma polícia encapuzada que está sempre a confrontar os jovens nas manifestações, e muitos dos opositores do governo de Uribe já foram mortos.
Ao passo que a noite caía, muitas revelações, tragos, idéias, sorrisos. Descobrimos que já havíamos estado com eles. Tinham tocado no bar Palafita no sábado, e lá estivemos para encontrar com Gugão, meu velho amigo, com quem morei em Porto Alegre.
Ao acordar na segunda me sentia mal, e devido a irritação com trâmites de notas e burocracia do edital, inflamei-me mais ainda. Percorremos Manaus de táxi, fui até a rodoviária e procurei informação acerca do bilhete para Caracas. Não havia. Só tinha para Puerto La Cruz. Muita confusão. Voltamos para o centro, nos abrigamos num hotelzinho. Almoço, câmbio de moedas, burocracia na alfândega, dores e dores. Decidimos partir para Boa Vista durante a noite. Conseguimos o bilhete graças a um senhor muito educado do hotel. Por sinal, aqui no Norte todos foram bastante atenciosos. Em Boa Vista principalmente, gente bastante simples. Chegamos terça e durante os dois últimos dias nossa rota foi hotel-hospital. Fiz exames e me consultei, depois de muita muita muita espera e paciência. E carinho, claro, porque indiazinha está aqui, pertinho de mim.
Amanhã partiremos. Chavez nos espera!
domingo, 8 de agosto de 2010
terça-feira, 3 de agosto de 2010
segunda-feira, 2 de agosto de 2010
Feira-São Luiz-Belém
cortei mais algumas esquinas, avistei prédios abandonados, cortiços, buracos onde o vento e a areia entram para preencher o labirinto da cidade velha, adormecida. mais algumas quadras, lá está! o tal Projeto Reviver. gente jovem, cabeluda, roupas coloridas, paredes grafitadas, música ao vivo, cervejinha na calçada... tudo me inspira, tudo me faz criar. enxergo Dira, minha personagem cantora de boleros, sedutora e atroz, suada, justa num vestidinho rosado, anarquizando a noite, rasgando corações.
sigo a caminhar, topo com um bonaerense hippie viejo, que me fala de Alcântara, cidade-fantasma fabricada para o rei francês. quiçá dê tempo de visitar, preciso voltar para o hotel maldito, espelunca quente do satanás, banheiro feito de box, que coisa horrível!
sinto-me como um escritor de 40, faço a barba, deixo o bigode... lembro de Jorge, de Gabo, dos mestres bigodudos e fantásticos... meu realismo é sequestrado, poetizo com a câmera... travellings, close-ups, planos gerais de encontros e despedidas, rodoviárias e paisagens... miro o sentimento do mundo, os corações desalentados e criminosos, verdes e rubros, brancos como esta folha de papel virtual, que não irei deixar por aí como fiz com o meu diário de viagem. Bahia, Pernambuco, Piauí, Maranhão, Pará... todos os relatos se foram, da estrada e da cidade, meus e dela, da mulher que viaja comigo, que antes de ontem, lembro-me bem, escreveu assim no diário: "sigo com ele"
e assim vou seguindo, com ela e a minha imaginação, fabulada nos gestos e nas idéias, nas praças e nas pessoas, mercados, bares, jardins, albergues, notas e notas para prestar conta, prêmio em festival de cinema, sorriso no rosto, velhos amigos, novos também.
me voy, me voy... em breve tem foto e tem vídeo, se a conexão deixar